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A jornalista Julianne Gouveia atua há dez anos na área da comunicação em iniciativas sociais pelo Rio de Janeiro. Formada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Cândido Mendes e especialista em Jornalismo Cultural pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), passou pela Central Única das Favelas (Cufa), foi editora do jornal A Voz das Favelas e do portal da Agência de Notícias das Favelas (ANF). Atualmente, é responsável pela Comunicação da organização da sociedade civil Spectaculu - Escola de Arte e Tecnologia. Com expertise em Social Media, desde a pandemia, também tem atuado no Núcleo de Mídias e Diálogo com o Público (Numid), no Museu da Vida, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Na primeira publicação do blogpost de 2021 e no momento em que a vacina contra o novo coronavírus ainda é recente no Brasil, Julianne aceitou o convite para falar, a partir do seu ponto de vista, sobre as ações da comunicação nas ONGs neste novo cenário de expectativa quanto ao retorno das atividades presenciais e da adoção do formato online como uma experiência exitosa. Afinal, um trabalho responsável de comunicação salva vidas.
Gecom: Conte um pouco sobre seus trabalhos de Comunicação nas ONGs e em outras iniciativas sociais.
Julianne Gouveia: Eu atuo nas áreas de comunicação, terceiro setor, educação e cultura há mais de dez anos. Comecei como voluntária de comunicação na Central Única das Favelas, depois de ter sido aluna de um curso de audiovisual, entre 2008 e 2009. Colaborei por quase um ano com o Cinecufa, que era voltado para o audiovisual das favelas. Na mesma época, fui estudar Fotografia na Spectaculu – Escola de Arte e Tecnologia, que é uma organização que existe há mais de 20 anos, no Cais do Porto. Lá, foi um divisor de águas na minha carreira, porque fiz contatos que proporcionaram as minhas primeiras oportunidades profissionais na área da Comunicação. Em 2012, fui convidada para trabalhar na área de comunicação com doadores da instituição. Em 2014, assumi a assessoria de comunicação da instituição, responsável por toda a comunicação da casa. Paralelamente a isso, eu continuei a fazer outras coisas, buscando novas experiências. Eu sou nascida, criada e moradora do subúrbio do Rio, então, a comunicação popular sempre foi uma questão importante pra mim. Entre 2016 e 2018, fui editora da Agência de Notícias das Favelas e do jornal A Voz das Favelas. Em 2018, também ganhei um concurso de projetos de reportagem na Agência Pública de Jornalismo Investigativo e Conectas – Direitos Humanos, com foco na Intervenção Federal da Segurança Pública. Fiz uma reportagem especial voltada para entender como a violência policial afetava a saúde mental dos moradores da favela da Rocinha. Em 2020, eu comecei a trabalhar no Núcleo de Mídias e Diálogo com o Público, no Museu da Vida, da Fiocruz. Estou lá desde abril e cuido das mídias sociais do museu, pensando estratégias com a equipe. O Museu da Vida tem uma relação muito importante com esses laços territoriais com Manguinhos, com o entorno. Estamos sempre inseridos nessas questões de alguma forma.
Gecom: A vacina finalmente chegou em nosso país. Algumas ONGs modificaram sua forma de trabalhar ou suspenderam suas atividades. Em sua opinião, elas já podem voltar às atividades normais e por quê?
Julianne Gouveia: Primeiramente, é importante lembrar que esse processo de vacinação contra o coronavírus no Brasil ainda tá muito, muito no início. Nesse momento, a gente ainda não tem disponibilidade de doses nem pra atender os grupos prioritários. Então, é muito cedo para a gente pensar que essa vacinação que acontece agora vai mudar os trágicos números que estamos vendo desde março do ano passado. Ainda vai levar muito tempo, alguns meses para que a gente de fato veja mudanças. Muitas instituições do terceiro setor não pararam. Houve um boom de doações em 2020, uma grande mobilização da sociedade em prol, principalmente, das populações vulneráveis que estavam na ponta, sofrendo com desemprego, com a inflação absurda, com a alta de preços dos alimentos. Muitas organizações não pararam, e inclusive, se fortaleceram nessa época, fazendo campanhas de doação de mantimentos, por exemplo. No ano passado, eu vi também muita responsabilidade. Nós, do terceiro setor, temos que ter mesmo essa responsabilidade social com as vidas das pessoas. Poderia ter havido uma pressão para o retorno, mas não houve. Em geral, houve uma compreensão por parte dos patrocinadores, todo mundo foi muito compreensivo com a situação, todo mundo estava muito disposto a adaptar seus planos de trabalho, a realmente entender aquela realidade. É muito complicado você exigir o retorno de atividades presenciais num projeto social, que lida com vidas de pessoas em situação de vulnerabilidade, pra quem, muitas vezes, falta tudo – até água para lavar a mão, para os cuidados básicos de proteção contra o coronavírus. Na minha experiência profissional e pessoal, isso também se refletiu bastante nas duas organizações que eu trabalho. O retorno às atividades tem sido pensado com muito cuidado, com muita delicadeza, porque a gente está lidando com vidas humanas. Eu acho que varia de organização pra organização, varia com relação ao trabalho que cada um realiza, mas tudo nesse momento tem que ser pensado com muita responsabilidade. Estamos lidando com as vidas das pessoas, mais do que nunca.
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Gecom: Com a pandemia, algumas ações de ONGs foram realizadas de forma online para evitar o contágio. Com a vacina, a tendência é que algumas dessas atividades voltem a ser realizadas presencialmente. Você recomenda algum tipo de cuidado ou não é preciso se preocupar?
Julianne Gouveia: É claro que a gente vai ter que voltar às atividades presenciais com todo o cuidado quando for possível. Pelo que ouço de especialistas de diversas instituições, talvez, até o final do ano a gente possa ter uma boa parcela da população vacinada. Mas a gente ainda não sabe como isso vai acontecer - se é que vai acontecer mesmo. Esse tipo de cuidado, o uso de máscara, vai ser uma coisa com a qual a gente ainda vai conviver por muito tempo, mesmo com a vacina, apesar de muita gente já não estar fazendo uso hoje. O coronavírus é uma doença que demanda uma responsabilidade coletiva. Não é só você pegar, o problema maior é transmitir para outras pessoas. Acho que esses cuidados vão perdurar por muito tempo e, inclusive, mudar nossos hábitos como sociedade. Talvez, o uso de máscara não venha a ser integral como agora, mas, talvez, a gente possa se portar como os japoneses. Eles têm o uso das máscaras como uma coisa comum, corriqueira. Usar máscara lá não significa que você está morrendo. Às vezes, você só está com uma gripe, e você sai de casa com a sua máscara por uma questão de responsabilidade coletiva, para não contaminar outras pessoas. O que eu mais gostaria que a gente levasse dessa pandemia é exatamente essa conscientização sobre uma responsabilidade coletiva.
Gecom: Em relação ao planejamento das ações de comunicação, na sua avaliação, as práticas adotadas na prevenção do coronavírus devem ser itens a serem incluídos na hora de planejar daqui pra frente, mesmo quando o vírus estiver controlado?
Julianne Gouveia: Sobre práticas de comunicação, eu acho que vale um debate até mais abrangente. Ano passado foi muito crucial para o setor de comunicação em geral, porque para muitas empresas não foi possível "existir" presencialmente. A única maneira de "existir" foi através da comunicação no universo virtual. Então, tem sido um movimento muito importante para a gente repensar muitas coisas na área de comunicação, na necessidade que as empresas e que as organizações têm de se comunicar de fato. As organizações sociais têm que pensar muito na experiência, na realidade e nas expectativas do público-alvo, casar essas três coisas. Fazer atividades online é sempre uma ótima saída, mas pode não atingir a todos. Existem lugares mesmo no Rio de Janeiro onde há dificuldade no acesso à internet, por exemplo. São escolhas. É preciso avaliar caso a caso e fazer o possível pra não abandonar o compromisso social de atender aos beneficiários, não só por uma questão de demanda de patrocinadores e apoiadores. Não existe uma fórmula única. Nesse contexto atual, todo mundo foi obrigado a se reinventar, cada organização a sua maneira. Todos estão se descobrindo bastante neste período. Acredito que os cuidados com a prevenção do coronavírus vão perdurar por muito tempo. Então, a comunicação interna, principalmente, vai ter que versar sobre isso, reforçar sobre essa responsabilidade coletiva que todo mundo tem.
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