Maria Helena Carmo, doutora e mestra em Comunicação. |
Instituições do Terceiro Setor precisam atentar para a construção e manutenção de sua imagem, reputação, relacionamentos diante de um cenário atualmente bastante complexo com a proliferação de fake news, impulsionada pelas mídias sociais. O ensino de técnicas de Relações Públicas contribui para que estudantes de Comunicação possam atuar de forma profissional e competente no Terceiro Setor.
O Gecom convidou a doutora em Comunicação, Maria Helena Carmo, que também é mestra em Comunicação e Cultura, graduada em Relações Públicas e em Letras, para explicar a importância de uma formação acadêmica na Comunicação, que possa contribuir para a profissionalização da área no Terceiro Setor.
Atualmente, Maria Helena é professora de Gestão Empresarial e Políticas de Comunicação, Comunicação Interna, Relacionamento com Cliente, TCC 1 e TCC 2 nas Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha) e professora de Planejamento de Eventos e Cerimonial, Produção de Eventos e Assessoria de Comunicação, na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Maria Helena, também, é coautora do livro "Megaeventos, Comunicação e Cidade", ao lado dos coautores Ricardo Freitas e Flávio Lins.
Gecom: Por que é importante ensinar relações públicas nas faculdades?
Maria Helena: A gente está vivendo há umas duas décadas a era do relacionamento, muito por conta do crescimento das redes sociais e do quanto elas acabam sendo um desafio para as organizações. Antes das redes sociais você tinha organizações pautando o que os clientes, os funcionários, o que a opinião pública iria saber das organizações das marcas. Com as redes sociais você tem o inverso disso. Você tem funcionários, potenciais funcionários, ex-funcionários falando sobre a organização, recomendando a organização, criticando a organização, pressionando a organização, os clientes, também, o que não diria da opinião pública. Você tem marcas hoje sendo questionadas: "por que elas fazem publicidade em um veículo de comunicação que faz campanha aberta contra atos antidemocráticos?". E questionam a marca: "Você jura que vai continuar patrocinando, anunciando nesse canal de TV?". Então, as marcas, as pessoas públicas, as celebridades, as formadoras de opinião estão muito expostas. Relações Públicas está neste lugar. No lugar de pensar no relacionamento das empresas, das marcas, de pessoas públicas, perante os seus públicos de interesse e de que forma a imagem, a reputação dos clientes, agências de relações públicas, profissionais de relações públicas, como ajudar a gerenciar essas imagens e essas reputações. Ter uma faculdade de Relações Públicas é ter um profissional mais antenado com a comunicação, que é cada vez mais desafiadora, cada vez mais pressiona marcas, empresas por posicionamentos.
Então, Relações Públicas fazer parte do currículo de graduação é a possibilidade de pensar a Comunicação da forma mais ampla possível, o que alguns autores chamam de uma comunicação mais integrada mesmo. Um olhar que não é só de mercado, marketing, vendas, mas um olhar institucional, também, sem jamais esquecer o público interno. Pensar a Comunicação mais alinhada com os tempos desafiadores que a gente vive, aglutinando os interesses e as necessidades de marketing, jornalismo ou publicidade, sempre com foco o relacionamento. Relações Públicas é na sua essência gestão de relacionamentos.
Gecom: Como a formação acadêmica na área de relações públicas colabora para o profissionalismo da Comunicação no Terceiro Setor?
Maria Helena: Eu fico muito feliz que na Facha, onde nos últimos seis ou sete anos talvez, eu venho percebendo um aumento no interesse de alunos de Relações Públicas em atuar no Terceiro Setor. Nós temos inclusive uma disciplina de Comunicação no Terceiro Setor, é uma área muito desafiadora. Sempre se pensou muito a Comunicação sendo mais profissionalizada nas empresas privadas, em seguida uma profissionalização das empresas públicas e o Terceiro Setor (porque é o mais "jovem" que o primeiro e o segundo setor) vem se profissionalizando nos últimos 15 ou 20 anos e os desafios são imensos. Essa profissionalização depende de um cenário não só internacional, mas um cenário nacional. A gente teve um crescimento, uma profissionalização do Terceiro Setor, se a gente colocar um marco de instituições voltadas para o meio ambiente, talvez em 1992, com a Rio 92, tenha sido um marco para a profissionalização do Terceiro Setor, não só no Brasil, mas também a nível mundial. A gente teve também uma certa pressão pela profissionalização no Terceiro Setor, fortemente na década de 90, por causa da explosão do número de pessoas com a Aids. Então, eu lembro que tivemos um grande número de instituições voltadas para a prevenção do HIV e apoio a esses pacientes. Na virada do século XXI, você tem uma questão muito ligada à saúde, principalmente à saúde infantil. Instituições do Terceiro Setor fortemente envolvidas na prevenção de saúde, de apoio às crianças que estejam em tratamento cardíaco ou com câncer, instituições voltadas à educação, muitas no esporte… E nos últimos anos, não só no Brasil, mas também no mundo inteiro, teve um determinado momento de enfraquecimento em algumas pautas no Terceiro Setor, por causa de questões mais econômicas e políticas internacionais.
O Terceiro Setor exige muito uma parceria com a iniciativa privada, pública e doadores de pessoas físicas. A questão de financiamento no Terceiro Setor via parceria com instituições públicas, privadas e doadores de pessoas físicas é absolutamente fundamental. Você tem que saber fazer um projeto, captar recursos, fazer relacionamento, fazer prestação de contas... Então, em algumas áreas do Terceiro Setor houve um enfraquecimento, seja no esvaziamento de políticas públicas (e aí estou falando no cenário nacional mesmo), seja pela exigência de profissionalização do Terceiro Setor, que também foi impulsionada por uma necessidade das empresas financiadoras demonstrarem o impacto na sociedade dos projetos sociais que elas apoiam ou patrocinam. Isso torna essencial para a profissionalização no Terceiro Setor, que passa pela profissionalização da Comunicação. Tanto na Uerj, quanto na Facha há uma disciplina especificamente para pensar esse setor, essas competências, habilidades, ferramentas necessárias para atuar nessa área.
Gecom: Quais os desafios acadêmicos para lecionar relações públicas e quais as propostas sugeridas para resolver essas questões?
Maria Helena: Um é a questão da proliferação das fake news, que é também um desafio da Comunicação. A gente está num cenário de disputa por uma criação de narrativas que não são necessariamente narrativas, são informações falsas. É muito complicado você trabalhar. Talvez seja o cenário mais difícil para área de Comunicação. Trabalhar no cenário em que as fake news são disseminadas de um forma algoritmica, em progressão geométrica, a capacidade de desmentir as fake news, atribuir às fake news, é complicado. A princípio, em Comunicação, seja relações públicas ou em jornalismo, a gente trabalha para sugestões de pautas que sejam positivas e as fake news colocam por terra essa premissa. Dependendo para qual instituição você está trabalhando, acaba enxugando gelo. Vê uma fake news, você tem que desmentir, dizer que é fake e, provavelmente, você não vai conseguir alcançar a mesma velocidade, o mesmo impacto que essa informação trouxe para um grupo o qual ela parece ser verdadeira. As fake news criam narrativas muito contrastantes e paralelas e fazer pontes em um cenário radicalizado, muito polarizado é muito difícil para o jornalismo e para a relações públicas.
Um outro desafio, que também está muito ligado às fake news, é tentar equilibrar. Algo que é fundamental quando se pensa a Educação, a necessidade de dominar e conhecer as ferramentas que a cada hora é uma nova, ou uma nova possibilidade dentro da mesma ferramenta com leituras que são absolutamente essenciais para o processo da Comunicação. Então, hoje você tem que responder muito rapidamente às demandas externas e internas, pensa muito na questão ferramental e muitas vezes você faz sem pensar exatamente por que está fazendo, naquele determinado momento, sem ter tempo para pensar ou refletir. Ou então, seu tempo é muito curto, muito rápido. Isso exige um planejamento e exige uma formação filosófica, sociológica, antropológica de comunicação e consumo se você trabalha com uma questão ligada ao marketing, questões éticas que demandam estudo, tempo, leitura, amadurecimento. Equilibrar uma questão de uma teoria que é absolutamente fundamental para uma prática responsável da Comunicação, ao mesmo tempo que você precisa dar conta do ferramental, eu acho que é um grande desafio da área e da educação, um segmento da Comunicação.
Trabalhar o marketing de causa social e mobilizar pessoas foram desafiadores e uma experiência interessante para Maria Helena Carmo. |
Gecom: Conte como foi sua experiência em trabalho voluntário.
Maria Helena: Já fiz alguns trabalhos voluntários ligados à questões de crises sociais e ambientais. Momentos em que você tem desastres ambientais no Brasil e você tem uma mobilização para recursos materiais ou financeiros, já atuei com isso especificamente. Trabalhei, não como comunicadora, mas foi um desafio, porque eu trabalhei para uma assessoria de uma rede de fast food, que tem uma grande campanha voltada para arrecadação de recursos para a fundação que dá suporte para crianças e adolescentes em tratamento de câncer. Durante algum tempo, fiquei focada nesse projeto. E foi interessante, porque ao mesmo tempo que fazia uma comunicação desta rede de fast food, eu fazia de certa forma da fundação. E eu procurava falar mais da fundação que leva o nome da rede, voltada para a causa em si. Porque de certa maneira, você acaba falando de uma questão que é o marketing de causa social, que é a principal ação dessa rede para captar recursos através desse planejamento de assessoria da qual eu fazia parte. Foi muito legal trabalhar com essa questão ligada ao marketing de causa e eu trabalhei especificamente com relação à comunidade. Projetos sociais, projetos culturais que envolviam a comunidade, a opinião pública e o grande evento social, que era esse dia voltado para a arrecadação. Foi um projeto interessante, mobilizar pessoas para participar da campanha. Mobilizar esportistas, apresentadores de telejornal, artistas, personalidades públicas de uma forma geral que dava conta de que essas pessoas se engajassem no dia do evento indo a uma determinada loja, indo a um determinado restaurante exatamente para ajudar nesse engajamento. Então, isso foi bem legal.
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